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O ecoturismo e a preservação de culturas e valores ancestrais

A lancha deslisa pelas águas escuras dos rios da Floresta Amazônica quando, de repente, estamos de frente para a pousada Uacari, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. Cinco bangalôs e uma construção principal flutuam sobre as águas negras. Ao desembarcar moradores da região nos recebem e, pelos próximos dias, serão nossos anfitriões para explorar o maior trecho de floresta alagada protegida do mundo. Começa aqui nossa jornada de conhecimento de quem luta em pele pela preservação de culturas.

Vista aérea da Pousada Uacari, na Amazônia. Foto: JP Borges Pedro

Mais do que conhecer a Floresta Amazônica, quem se hospeda na Pousada Uacari irá conhecer o povo da floresta. Ao entrar nas comunidades para conhecer as casas de palafita e a produção de farinha, estamos dentro da vida deles, com seus filhos correndo ao redor, as lideranças locais discutindo melhorias para o lugar, a vida acontecendo na floresta.

Mulheres trabalham na produção de farinha na comunidade Vila Alencar, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá. Foto: Marcio Sanches / Expedição Raiz

Quando nos abrimos a este tipo de turismo, descobrimos novas formas de ver o mundo, e ainda oferecemos muito em troca.

 

O ecoturismo como forma de reforçar os laços ancestrais

Os moradores de cada região do país, em suas pequenas comunidades, são profundos conhecedores da cultura popular. Os quilombolas, espalhados por boa pate do Brasil, são um exemplo muito rico da promoção de um turismo cultural, étnico e comunitário.

É o que podemos vivenciar quando vamos para a Chapada dos Veadeiros, e ao visitar a cachoeira de Santa Bárbara adentramos na comunidade de Engenho II. Esta, e outras comunidades Kalunga da região, eram completamente desconhecidas do governo brasileiro até o começo dos anos 1980. Outro exemplo é a comunidade quilombola de Mumbuca, no Jalapão, hoje conhecida pelo artesanato com capim dourado. Estas duas comunidades preservam suas identidades culturais e cria, dentro de sua própria população, um sentimento de apropriação e valorização do saber popular. São exemplos de como a natureza exuberante e a cultura podem transformar a forma de se praticar turismo.

Crianças Kalungas da comunidade Engenho II, na Chapada dos Veadeiros. Foto: Ion David

Estes grupos de descendentes de escravos, que tanto lutaram e se defenderam, hoje estão organizados e atuantes pela preservação das raízes de seus ancestrais. Mais que tudo, neste locais podemos perceber que os jovens, ao invés de abandonarem sua terra e irem para a cidade grande, ficam e se tornam líderes locais.

Artesanato em Capim Dourado, realizado pelas mulheres da comunidade Mumbuca, no Jalapão. Foto: Cleusa Leite

Segundo o artigo “O turismo rural comunitário na América Latina, gênesis, características e políticas”, de Carlos Maldonado, o patrimônio comunitário é formado por um conjunto de valores, conhecimentos, técnicas e habilidades, terras e territórios, assim como todos os tipos de manifestações existentes em um povo. Através disso, eles expressam seu modo de vida, sua identidade cultural e suas relações com a natureza.

Os caiçaras, pescadores espalhados pelo extenso litoral brasileiro e que vivem do mar como viviam seus antepassados. As comunidades ribeirinhas ao longo das margens dos rios amazônicos. Os pantaneiros, descendentes de europeus que se adaptaram ao modo de vida sertanejo, e cada história que sobrevive em cada rincão são registros da riqueza cultural brasileira.

Pantaneiros, acostumados a usar o cavalo para guiar as boiadas no pantanal, também levam turistas para conhecerem seu estilo de vida. Foto: Divulgação Refúgio da Ilha

 
O ecoturismo como geração de renda local

O Brasil, pelo seu tamanho e sua história, possui uma das maiores riquezas naturais e culturais do mundo. Tamanha diversidade faz do país um território incrível para o ecoturismo e o turismo de aventura. Dentro deste contexto de natureza preservada, o turismo possibilita novas opções de renda em locais onde a subsistência ou a migração sempre foram as primeiras opções.

Segundo a consultora de turismo consciente Gabrielle Monteiro, hotéis de selva na Amazônia, como o Cristalino, Anavilhanas e Juma, são exemplos muito marcantes de envolvimento da comunidade. “O Anavilhanas, por exemplo, tem 90% dos funcionários de Novo Airão. Gera, então, muito emprego localmente.”

Casa de moradores de Baixa Grande, um oásis dentro dos Lençóis Maranhenses, onde os turistas passam a noite e convivem com os moradores. Foto: Andreia Góes

No Vale do Pati, Chapada Diamantina, nos hospedamos na casa de moradores locais como a Dona Lea. Na Travessia dos Lençóis Maranhenses, dormimos em redes nas casas simples em oásis como a Baixa Grande. São exemplos de como a comunidade aumenta sua renda, afirma suas origens e, com uma importância tão grande quanto, mantém o meio ambiente em seu estado natural, preservado.

O ecoturismo como forma de preservação ambiental

O ecoturismo e o turismo de aventura já absorveram o conceito de agregar os valores das comunidades locais.

Um exemplo muito interessantes de envolvimento com o meio ambiente é na Serra da Mantiqueira. Os guias são jovens que nasceram com as montanhas no quintal de casa. Eles propagam, para cada pessoa que chega até eles, o sentimento de preservação ambiental e de mínimo impacto, promovem ações de conscientização e retirada de lixo das trilhas. E você, quando você sai de lá, percebe a importância de tais ações para que estes ambientes, tão frágeis, se mantenham intocados.

 

Esse é o grande diferencial do ecoturismo. Lá fora, no exterior, o ecoturismo é sinônimo de turismo sustentável. No Brasil, ele ainda está associado ao turismo de natureza, e precisa estar cada vez mais associado à sustentabilidade, pois está diretamente relacionado à preservação, nos conta Gabrielle. Eu acho que as pessoas que são engajadas, e o público de ecoturismo de alguma forma é engajado, prefere fazer uma viagem que gere um impacto positivo, ao invés de uma viagem que ele só consome, só se utiliza do lugar, sem agregar nada ao local, completa.

Com apoio no resgate da identidade cultural e suas relações com a natureza, o turismo abre perspectivas para a valorização do acervo do patrimônio natural. Graças ao turismo, as comunidades estão cada vez mais conscientes do potencial que seus bens patrimoniais, ou seja, o conjunto de recursos humanos, culturais e naturais, incluindo formas inovadoras de gestão de seus territórios, conclui Maldonado em seu artigo.

E, para os turistas, o ecoturismo abre novos horizontes. Nos apresenta a novas formas de vida. Conhecimentos ancestrais que já havíamos perdido. Uma reconexão, não só com a natureza, mas com nossa cultura ancestral, espalhada em cada canto do Brasil.

Na Pousada Uacari, os guias locais se tornam grandes professores, que nos ensinam muito mais sobre a vida do que sobre a floresta. Foto: Otávio Lino / Expedição Raiz

 

Para experimentar um pouco do ecoturismo, confira aqui os roteiros da Pisa Trekking. Especialistas nesse tipo de viagem, são inúmeras opções no Brasil e no mundo. Tire todas as suas dúvidas com nossos atendentes e viva a diversidade cultural!

 

Leia outros textos do blog:

 

Bibliografia:

O artigo “O turismo rural comunitário na América Latina, gênesis, características e políticas” é parte integrante do livro "Turismo de Base Comunitária, diversidade de olhares e experiências brasileiras", que pode ser baixado no site do Ministério do Turismo neste link.

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Otávio Lino

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Otávio Lino
Tags: amazôniaculturaecoturismopreservação de culturasquilombolasribeirinhosturismo comunitário

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