O desconhecimento dos princípios de mínimo impacto ambiental pode ter consequências realmente desastrosas quando se vai acampar ou fazer uma trilha. Por isso, da mesma forma que revisamos dezenas de vezes os equipamentos que vamos levar para ter certeza de que nada está faltando, precisamos garantir que nosso passeio não será prejudicial ao meio ambiente. Hoje, o Blog Vida ao Ar Livre explica como minimizar impactos socioambientais, com ajuda do guia de trekking e expedições Felipe Pimentel, especialista em Não Deixe Rastros.
A importância do acompanhamento profissional
Todos os anos, especialmente nas épocas de seca, surgem notícias a respeito de incêndios em florestas que começaram a partir de acampamentos com fogueiras, por exemplo. Não são incêndios propositais, mas sim frutos do descuido, da inexperiência e da ignorância. Esquecer de apagar a fogueira antes de ir dormir, ou não extinguir totalmente as brasas, são erros comuns que podem causar danos irreparáveis. E em muitos lugares, especialmente em unidades de conservação, fogueiras não são nem permitidas.
Assim, uma boa maneira de começar a se tornar mais responsável no meio selvagem é ter acompanhamento profissional. Um guia experiente não apenas toma conta de todos esses detalhes, garantindo que as atividades sejam seguras tanto para o grupo quanto para a natureza, como também atua como um instrutor que poderá te preparar para futuras viagens.
Segundo Felipe Pimentel, guia especialista em mínimo impacto, essa está virando uma obrigação das empresas de ecoturismo: “O ecoturismo em muitos lugares já evoluiu para um nível mais educacional. Não é você simplesmente falar, 'A plantinha é essa ou a montanha tem tantos metros de altitude.' É trazer a importância dos ecossistemas para nós, e fazer com que as pessoas tenham uma consciência maior de onde eles estão.”
Felipe é formado em turismo, e já trabalhou como instrutor em empresas como Pisa Trekking, NOLS e Outward Bound Brasil, tendo atuado no Brasil, Chile, Argentina, Venezuela e Estados Unidos. Hoje, ele está cursando uma pós-graduação em Meio Ambiente e Sustentabilidade, e criou uma conta no Instagram para falar sobre o assunto: @nao.deixe.rastros.
Espaço para aprendizagem
Viagens guiadas geralmente apresentam pouco espaço para erros, tendo em vista que os guias tomam conta de tudo. Mas quando os turistas ficam no comando, os desvios e enganos começam a aparecer. Felipe cita expedições educacionais em que os alunos são responsáveis por fazer a comida no acampamento: “Depois de toda refeição a gente tem que recolher o macarrão que cai no chão, e que às vezes eles não percebem ou não querem pegar. Tipo, ‘Caiu macarrão no chão, é orgânico então deixa lá.’”
Por isso, também é importante que o cliente apresente uma curiosidade ativa, a fim de que a aprendizagem seja mais completa e eficiente. Antes de viajar, por exemplo, um primeiro passo importante seria fazer uma pesquisa autônoma para entender o porquê de esses cuidados serem necessários. Afinal, da mesma forma que os clientes aprendem com os guias, os guias também podem aprender com os clientes.
Felipe cita um programa da Outward Bound Brasil que será lançado em breve, Leave No Trace Trainer, que visa aprofundar os princípios de mínimo impacto e discutir questões relacionadas à ética socioambiental: “Esse não é um assunto que morre depois de você ler um artigo na internet. O programa que a gente tenta desenvolver aqui no Brasil é justamente, ‘Você sabe? Beleza. Vamos conversar.’”
E se você já quiser adiantar a lição de casa, é importante se familiarizar com o conceito de Leave No Trace, ou Não Deixe Rastros, em português. Ele se refere aos 7 princípios básicos que toda pessoa deve seguir para causar o menor impacto possível no meio ambiente, quando for acampar ou fazer trilha. Confira abaixo.
Princípios básicos de Não Deixe Rastros
- Planeje e prepare-se com antecedência: conheça os regulamentos e cuidados especiais da área que você irá visitar; prepare-se para condições climáticas extremas e emergências; evite a alta temporada; visite em grupos pequenos; traga bússolas e GPS.
- Viaje e acampe em superfícies duráveis: restrinja os lugares de acampamento a superfícies de rocha, cascalho e grama seca, ou a acampamentos já existentes; permaneça a pelo menos 60 metros de distância de corpos d’água; caminhe em fila indiana e no meio das trilhas; não crie novas trilhas nem novos locais de acampamento.
- Trate adequadamente seus resíduos e seus dejetos: o que trouxer, leve de volta - isso inclui lixo, restos de comida e papel higiênico; deposite as fezes humanas em buracos de 15 a 20cm de profundidade e afastados de cursos de água, ou então utilize shit tube.
- Deixe o que encontrar: deixe pedras, plantas e demais objetos naturais da maneira que os encontrou; não construa novas estruturas e não introduza ou transporte espécies exóticas; não toque em artefatos históricos ou culturais.
- Minimize o uso de fogueiras: ao invés de fazer fogueiras, utilize fogareiros para cozinhar, lanternas para iluminar, e roupas adequadas para suportar o frio; quando fogueiras forem permitidas, use locais já estabelecidos com madeiras retiradas do chão; mantenha as fogueiras pequenas; queime toda a lenha e carvão até restarem cinzas, e depois apague a fogueira completamente e espalhe as cinzas.
- Respeite a vida silvestre: nunca alimente animais; observe-os de longe, não siga nem se aproxime; mantenha-os longe da sua comida; evite contato em épocas de acasalamento, formação de ninhos, quando estiverem com filhotes ou no inverno.
- Respeite os demais visitantes e comunidades locais: seja cortês e dê passagem aos outros nas trilhas; ao cruzar com animais de montaria ou gado, vá para a parte baixa da trilha para não assustá-los; evite falar alto ou fazer barulho; acampe afastado das trilhas e de outros visitantes.
É importante ressaltar que esses princípios estão em constante evolução, sendo sempre embasados por pesquisas científicas. Além do Não Deixe Rastros para visitantes, outro guia também foi elaborado para pessoas que trabalham em ambientes naturais. Todas as informações podem ser encontradas, em inglês, no site Leave No Trace - Center for Outdoor Ethics.
Princípios, não regras
Também é preciso se atentar ao fato de que esses são princípios de conduta, e não regras fixas. Assim, eles devem se moldar a depender do bioma onde você se encontra, da época do ano e do tamanho do seu grupo, por exemplo. Felipe conta sobre um roteiro que percorre um rio na região do Deserto de Utah, onde a recomendação é fazer xixi na água barrenta do rio, e as fezes em uma caixa de ferro que será esterilizada no final do roteiro pelo próprio parque nacional.
“Isso ilustra o quanto as coisas podem ser completamente diferentes”, diz. “Em nenhum lugar na Mata Atlântica, num corregozinho, você vai receber a orientação de fazer xixi lá.” A diferença, nesse caso, se dava ao fato de que o solo árido do deserto teria muito menos condições de decompor a urina do que o solo úmido e rico de uma floresta.
E embora alguns princípios pareçam naturais e intuitivos, é preciso refletir seriamente sobre cada um deles. Felipe comenta que muitos turistas levam caixinhas de som e violões para acampamentos como forma de entretenimento, e acabam atrapalhando a experiência alheia e desconsiderando o último princípio.
“Tem muitos grupos que não estão lá para ouvir música, e sim pra ouvir o passarinho, pra tentar ver algum bicho. A partir do momento em que alguém liga uma música, tudo o que é bicho que está à nossa volta vai embora.” Assim, é preciso fazer uma autocrítica e entender que atitudes ingênuas também podem ser prejudiciais.
Impactos positivos do turismo
Conhecer e respeitar esses princípios é importante para que o turismo continue a exercer a sua função de auxílio à preservação de áreas naturais, e de incentivo à conscientização da população sobre a sua importância. Apesar dos acidentes que ocorrem e das atitudes negligentes de alguns turistas, o turismo tem um potencial positivo que em muito excede o seu potencial negativo.
No âmbito social, por exemplo, ele valoriza as comunidades locais, e leva trabalho para regiões que estavam esquecidas e até precarizadas. Tal a importância de contratar guias locais, que além de fornecerem informações inéditas e extensivas a respeito daquela região e sua cultura, também garantem que ela seja preservada e continue sendo uma fonte de renda para o seu povo.
O turismo também arrecada fundos para reservas naturais e parques nacionais, fornecendo mais recursos para a sua proteção e aumentando a sua relevância econômica. Através desse processo, a população no geral, ao se familiarizar com os espaços naturais, também se sente mais responsável por eles, levando os princípios de mínimo impacto socioambiental e sustentabilidade cada vez mais a sério.
Felipe argumenta que, no futuro, seria importante que os próprios funcionários dos parques nacionais fossem capazes de disseminar os princípios de mínimo impacto para os turistas, ao invés de apenas ocuparem funções de fiscalização. “Tem coisas que vão dar um trabalho no começo, mas ele é um trabalho que depois de feito anda por si só. As pessoas se adaptam.”
Agora que você já conhece os princípios de mínimo impacto ambiental, que tal começar a colocar essas ações em prática? Para tanto, conte com os serviços da Pisa Trekking. Especialistas em ecoturismo, oferecemos várias opções de pacotes para parques nacionais. Confira todos aqui e tire todas as suas dúvidas com nossos atendentes!
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